O dia de amanhã


Um destes dias tive uma conversa muito interessante com um senhor que tinha uma quintinha para alugar. Ele dizia-me que devemos ter sempre a nossa vida planeada, pelo menos, para os próximos cinco anos. Eu respondia-lhe que, se aprendi alguma coisa na vida, é que não vale a pena fazer grandes planos porque a vida dá muitas voltas, porque evoluímos e mudamos, porque o nosso objectivo de hoje pode não ser o mesmo de amanhã.
Apesar do meu desapego, acredito que devemos lutar pelos nossos objectivos, pelas boas causas e que devemos planear o futuro, mesmo tendo em conta que há mais imprevistos na vida que buracos nas estradas.
Esta conversa vem a propósito de um caso de uma senhora com quase oitenta anos que está hospitalizada e cuja cadelita foi parar ao canil municipal.
Ninguém pode prever se a saúde nos trairá e deixaremos de poder cuidar, tanto física como financeiramente, dos nossos companheiros de vida. Mas, a partir de certas idades, essas traições da saúde tornam-se mais prováveis. Por isso, tenho um lema: para pessoas idosas, animais idosos.
Lembro-me do caso do Meiguinho, um cão velhote que esteve em minha casa para adopção. Teria tido um dono que o abandonou. Viveu muitos anos na rua, sendo alimentado por umas senhoras dedicadas. Quando a idade começou a doer e as articulações a pedirem conforto, o Meiguinho começou a pedir às tais senhoras que o levassem com elas. Foi assim que veio parar em minha casa.
Nessa altura, conheci uma rapariga que andava à procura de um cãozinho para a tia do namorado que tinha enviuvado recentemente. Como a idade e a saúde da senhora já não lhe permitiam passear com um cão que puxasse muito a trela, procuravam um cão de porte pequeno.
Achei que o Meiguinho era o ideal. Nem tão pequeno que a senhora tivesse de se baixar para o acariciar, nem um jovem cheio de energias que o arrastassem para correrias doidas. Além disso o Meiguinho é daqueles cães que não precisam de trela. Sabem andar na rua e seguem o dono como uma sombra. Tudo o que ele precisava era de um colo onde encostar a cabeça…
A senhora não poderia encontrar melhor companheiro; já educado, comportamento excelente e, sem dúvida, que se saberia mostrar profundamente grato à sua salvadora.
Mas não! O namorado recusou o Meiguinho, porque a idade não perdoa e as artroses também não, este cão coxeava ligeiramente de uma pata. O rapaz não queria dar à tia um “cão coxo”.
Ambos, o cão e a tia, perderam uma excelente oportunidade de amor. Nem sei qual ficou a perder mais…
O Meiguinho foi acolhido pela União Zoófila e a tia, calculo, que esteja a definhar na solidão da última fase da sua vida.

Nenhum comentário:

"Sempre que um cão sai das minhas mãos para uma nova família, desejo que o tratem tão bem, ou ainda melhor, que eu. Desejo que compreendam que o cão não entra na suas vidas para os fazer felizes, mas, inversamente, a ideia é eles fazerem feliz o cão."